Por muito tempo, quando comecei na fotografia em 2011, o rolo de Pro Image 100 custava 9,90 e isso me incentivou demais a brincar de fotografar. O interesse era tão grande que virei fotógrafa e professora, incentivei muitos alunos a gastarem 30 reais em um TRI-X e revelar em casa com café barato.
Naquela época, eu também achava que meu olhar poderia ser treinado pelo filme, afinal… 12 ou 36 poses não dava margem para erro.
Até que eu entrei em comunidades e vi que fotografia analógica pode ser apenas um hobby e muita gente entra nessa pela vibe antiga, usando como desculpa para fazer fotografia questionável.
Não tenho nada contra fotografias questionáveis, porém, para que esse argumento de treinar o olhar seja válido e que você se reconheça como fotógrafo, o conhecimento vai além de fazer fotos de moças em trajes mínimos ou jogar o flash estourado na cara de um morador de rua.
Você precisa saber como tem que fazer, antes de ser “revolucionário”. E isso vale para qualquer tipo de arte, desde fotografia até arquitetura ou dança: imagina se Niemeyer simplesmente jogasse suas linhas no papel e falasse: “toma aí que é arte”, muitos de seus prédios não estariam em pé.
Mas a fotografia é uma arte “inofensiva” e acessível e eu não deveria fiscalizar o shutter de ninguém, certo? Certíssimo… e é por isso que estou escrevendo no meu blog e não batendo na sua porta obrigando a ouvir a palavra das digitais.
Contudo, o estudo da arte vai além de clicar, revelar, escanear e curtir o light leak que deu a “vibe”.
Mesmo ainda usando câmera de filme (vencidos desde que entrei em depressão), hoje em dia acredito que existem maneiras de treinar o olhar de maneira diferente.
Fotografia analógica deixou de ser um hobby “acessível”
Vamos combinar que, desde que surgiram as cybershots, filme se tornou um hype elitizado, afinal, mesmo que eu gastasse 10 reais em revelação em 2012, seria muito mais barato comprar uma Sony e treinar por ela.
Hoje em dia, um rolo de filme que venceu antes de você poder andar é quase 40 reais. Eu nunca fotografei com Portra em 2012 porque ele custava caro. Hoje olho o preço e me contento com um preset do Lightroom.
Câmeras cada vez mais caras (e sem necessidade)
“Ah, mas eu preciso de uma Leica pra começar”. Não. Você pode comprar uma M35 da Kodak. Se for para brincadeira, qualquer saboneteira ou Instax vale.
Rangefinders e SLR sempre foram caras e agora parece que você precisa vender um rim para ter uma Canon AE-1 Program e usar no automático. Você não sabe se o hype ou sua vontade vai passar e, acredite, muitas câmeras que chegam a 2k não valem metade.
Treinar o olhar com algo que você não vai nem lembrar qual o EXIF usado não faz sentido
Se sua intenção é aprender a fotografar, como avaliar uma foto que você não anotou qual a abertura, velocidade ou até o ISO (se foi puxado ou não)?
O melhor conselho que consigo dar é: coloque a câmera do celular no manual e teste as configurações. Algumas câmeras possuem modo manual e são menos caras: dominando a máquina, você consegue bons resultados que podem ser postados no Instagram, mas não entregue a um cliente.
Não adianta ter uma M6 se você esquece de tirar a tampa da lente…
Bagagem cultural é mais importante que sua Nikon F e filme vencido
Só conseguimos alcançar bons resultados na área criativa quando consumimos arte e cultura: estude, leia, vá a museus, entenda sobre cores, movimentos artísticos, softwares, assista novela (até Mutantes!) e esteja aberto para que essas referências façam parte do seu trabalho.
E assuma: você usa filme pela nostalgia, pela experiência ou pelo hype
Sou grande fã de viver experiências, coisas que ninguém me tira. E isso não me faz menos fotógrafa de filme que ninguém.
Gosto do cheiro, de sair de casa para revelar filmes, esperar, do barulho do filme sendo carregado, disso tudo.
É um pouco da minha criança interior que nunca teve a chance de queimar um filme porque era caro e também um pouco de segurança: não vou sair na rua com o trambolho da minha D700 e as lentes, principalmente pelo fato de não ter coragem de comprar outra DSLR hoje em dia.
Se for pelo hype, sem problemas, só não venda no Enjoei pelo triplo do preço!
Hoje em dia, treinar o olhar é muito mais fácil com a quantidade de câmeras que temos disponíveis e se você quer um bom resultado, desafie-se, coloque um limite de cliques na digital e tente composições diferentes, sem apertar o botão infinitamente.
No mais, usando filme ou digital, o importante é fotografar! Façam bom uso do equipamento (sejam éticos, por favor).
